segunda-feira, 21 de março de 2011

Ressaca dos sentimentos

Difícil saber o porquê eu tenho escolhido beber. Ontem eu poderia ter ficado cá em casa a cuidar das minhas coisas, tentando não me preocupar com minhas unhas, comendo uma pizza com meus pais, trocando carinhos com a ***, talvez deitar e assistir um filme. Mas o que será que faz isso por vezes parecer não estar de acordo com minhas aspirações, essa vida parecer, no fim, não ser mais do que o cumprimento de um gabarito? A tristeza quase pacata e conformada que sinto agora é por uma percepção de que não adianta grandes lamentações, a mudança que quero operar em minha vida não passa pelo simples ato de parar de beber, mas por uma motivação que eu não sei exatamente onde está. Não posso cair no fatalismo de pensar que esse mundo não me reserva nada mais do que viver em uma superfície de mim mesmo, sem grandes paixões, sem grandes descobertas.
Quanto a minha querida ***, não sei o que fazer. Ocorre-me uma vontade de escrever para ela e expor minha fraqueza em busca de algo como compreensão e carinho. Por vezes isso me parece justo e pertinente já que agora ela faz parte de minha vida emocional e a forma como ela tem funcionado, mesmo que regada a álcool, é essa. Por outro lado, nada ela pode fazer. Não há, de fato, uma separação grande entre o “eu” que entornou o primeiro copo ontem, aquele mesmo que ela rejeitou, e o “eu” desse momento. A tristeza que me ocorre agora é um momento do mesmo processo, do mesmo acontecimento.

quinta-feira, 17 de março de 2011

"necessidade" do alcool

As dores que sinto em meu corpo me causam um receio de morrer antes de conseguir sair dessa vida, desse buraco em que estou. Tem sido cada vez mais difícil beber. A pinga e o vinho de péssima qualidade que meu pouco dinheiro me permite comprar não são mais bem aceitos pelo meu corpo que reclama uma trégua. Meter goela abaixo essas tranqueiras para poder me esquecer das minhas dores tem sido cada vez menos prazeroso. Mas não consigo sair disso assim como não consigo sair da presença cada vez mais incomoda dos meus pais e, sobretudo, da presença de mim mesmo quando estou perto deles. Sou raivoso, inquieto, amargo, rude e folgado quando estou perto deles. Não pareço nem de longe o ser humano que em certos momentos fez eu gostar de estar em minha companhia. A possibilidade de eu levar isso adiante poupando meu corpo e me concentrando na travessia que supostamente me prepara sentimentos melhores me parece cada vez mais remota. É claro que essa travessia não pode existir enquanto eu não existir. Não me sinto, ignoro na maior parte do tempo o meu corpo e o sentido das coisas que sinto e faço. Minha vontade é ignorar meus pais, fazê-los entender que eles não me ajudam, mas me sufocam, que permitir que eu beba jogado num quarto sozinho não é me entender. Qualquer tentativa de eu sair disso é logo direta ou sutilmente vigiada, medida, questionada. Ou eu morro ou eu definho nessa casa.

Não beber?

A raiva, a culpa e o ressentimento me paralisam. Sinto-me vítima de sentimentos que nunca imaginei fossem crescer e se transformarem em quase incontroláveis, sentimentos que me fazem temer as pessoas, deixar de trabalhar e ser joguete de minha própria vulnerabilidade. Tenho fumado e bebido de forma a machucar meu corpo e não consigo parar. (tempo para pensar) Eu não consigo lidar com meus pais e tomar qualquer decisão que me pareça acertada, pensada ou que, enfim, não seja baseada nesse turbilhão de sentimentos me custa horrores. Acabo por me render.

Irritabilidade gratuita, medo do fracasso. Seria a boa hora para tomar aquela dose de aguardente e esquecer. Me pego ao mesmo tempo preocupado em estudar e fazer as coisas que preciso fazer e com pouca inspiração para tal. Minha cabeça trava! Mas eu quero experimentar não beber, pois bebendo eu tenho acumulado esse mal estar que nasce da pouca produtividade e criatividade que eu tenho tido nas coisas que gosto de fazer, que nasce também da pobreza que tem sido minha relação com as pessoas e coisas ao meu redor. Eu posso criticar, pensar ou procurar alternativas para os valores do mundo em que vivo com relação a exigências de produtividade ou ao afeto, e o álcool realmente me ajuda, ou me ajudou em certos momentos, a encontrar certos caminhos de pensar e sentir, mas definitivamente, agora, ele tem me tirado justamente a possibilidade de fazer isso a não ser de forma muito infértil. Inversamente, o uso que tenho feito do álcool só tem me tirado qualquer chance de trabalhar e sentir. Uma coisa é cair na armadilha dos valores da “sociedade do espetáculo”, ou como queiram chamar, outra é desistir de achar outros caminhos. Álcool representa isso para mim hoje: desistir.