terça-feira, 23 de novembro de 2010

"História de Amor duram Apenas 90 Minutos"

Quem assistiu a esse filme de Paulo Halm talvez nem tenha reparado, o uso do Álcool (e outras drogas) pelo protagonista perpassa quase toda história. O álcool não tem na história um foco, é claro, mas ele aparece como um elemento que compõe a forma do Zeca funcionar em meio aos seus medos, suas frustrações, seus desejos. Mostrar o uso do álcool como um elemento que não determina o comportamento, os desejos, que não transforma o alcoólatra em mero doente cujas vontades e falas são reduzidas a sintomas (como quer o AA, por exemplo), mas ao contrário, como algo que atravessa essas vontades, a vida, que acontece ao mesmo tempo em que a vida, me pareceu uma das grandezas desse filme. Há cenas em que Zeca claramente, ao se sentir em dilemas, recorre ao álcool ou a outras drogas (vide, por exemplo, quando ele começa a imaginar a namorada dele “ficando” com a amiga numa festa, ou quando ele está a ponto de trair a namorada, ou quando ele tenta conversar com o seu pai, entre outras). Pobres filmes que banalizam o alcoólatra, que o reduzem a mero doente ou o desqualificam a quase semi-humano.

domingo, 21 de novembro de 2010

Vergonha!!!

A vergonha é algo bem conhecido pelos alcoólatras, talvez poucos tenham uma experiência tão intensa com ela. Por vezes uma revelação desproposita, um telefonema ou um e-mail feito na madrugada, uma taradice, histórias inventadas. O Ridículo, é isso, a relação do alcoólatra com o ridículo é forte e intima. Por vezes quando acordo e tento lembrar das coisas que fiz e falei, ainda deitado na cama, me parece que o mundo não tem mais ordem, nem gravidade, nem lógica de funcionamento, as imagens e as pessoas aparecem cortadas em camadas, as cores viram e desviram seus negativos, não há mais ordem na minha vida e não há mais ordem no mundo. Isso na verdade não vem à cabeça naturalmente, o mais fácil é querer ficar na cama o resto do dia, sonhando, imaginando, me escondendo, mas pensar no mundo e nas imagens sem a ordem comum delas é uma forma de levantar e tentar fazer as coisas que precisam ser feitas, que quero fazer. No extremo, o ridículo ajuda a sair do mundo onde eu sou apenas aquela personagem. A vergonha, no extremo, faz pensar que é preciso encarar e que se foda, já foi feito, ou continuo ou volto a beber. Mas beber tem limites, não se pode beber a toda hora, o corpo não agüenta, se quer beber precisa pagar a pinga, precisa estar vivo, precisa ter corpo.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

"Álcool é uma aventura ao alcance dos covardes”

21:42. A sensação de estar satisfeito por vezes me aparenta, como hoje. De repente as coisas parecem estar em ordem, coisas que por vezes eu desejava em sonhos e devaneios parecem estar acontecendo. Mas a felicidade é tão efêmera quanto a dor, as duas coisas por vezes cria desejo de morrer. Eu poderia morrer agora, penso. Minha covardia não é por medo da felicidade, nem da dor, mas do futuro, do que eu ainda não sei. É como um miserável que ao ganhar uma fortuna se agarra a ela e se torna mesquinho, quer guardá-la a sete chaves, quer cristalizar o momento e nunca mais deixar aquele estado. Não, não é assim, não há nenhuma conquista que nos garanta um final feliz, nem há um caminho linear para a felicidade, para a satisfação, assim como não há dor que signifique a derrota, a vida é feita de rupturas. Eu já me senti feliz a ponto de parecer que eu poderia abraçar o mundo, assim como triste a ponto de... Não há como assegurar as conquistas nem evitar as derrotas, só se faz isso quando se deixa de viver. Você pode até tentar tornar a vitória perene, pode até ter êxito por um tempo, mas não pode reproduzir a satisfação da vitória por nem mais um segundo após ela ter acontecido. Não há medo de ser feliz, há medo de deixar de ser feliz, de ter e perder. O grande vício na vida é o medo de ser tocado, ser afetado. Por vezes conhecemos nossa dor tão bem que é mais cômodo ficar nela do que arriscar ter novas satisfações. É como a volúpia do enfermo ou do mal amado: “onde estou eu conheço, se sair daqui corro o risco de cair de novo”.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

23:51, eu estou cansado de sentir essa dor, esse peso de ter que ser eu mesmo a todo momento. Não há nada no mundo que não seja eu, nada chega a minha consiência antes ou na mesma hora de se transformar em "eu". Alguns goles de aguardente e viro líquido, me perco, me misturo a tudo a meu redor, não tenho mais vergonhas. Tenho dores sim, as vezes até choro e sofro demais, mas é uma dor líquida, que não traz mais medo, que não se esconde, uma dor que se inventa e se celebra.
Meu pai, gostaria de poder formular o que sinto por ele, as vezes me acho injusto em me incomodar com a presensa dele sem saber exatamente o porque. Se ao menos eu tivesse um motivo, mesmo que falso, mesmo que uma formulação criada por mim, mas algo que eu pudesse acreditar e usar como explicação para as coisas que sinto. Mas não, não há nada. Me comovo as vezes com a paciência dele, com as tentativas sem jeito dele em chegar perto de mim.